…DEAD MAN WALKING… Quando o desespero mata a Esperança.

NOTICIA

Imagino-o em casa, depois de ter ido visitar a sua companheira de sempre aos cuidados intensivos.

Imagino-o só, a tentar dar algum sentido à angústia que sentiu quando a viu entubada e com suporte ventilatório.

“Porque é que ela tem que sofrer tanto?” – ter-se-á perguntado.

De vez em quando os alarmes das máquinas disparam e depois calam-se novamente, mas não está lá ninguém para as ouvir senão ele.

De início corria a chamar as enfermeiras, mas estas iam-lhe dizendo que era normal, que as máquinas eram hipersensíveis e disparavam por tudo e por nada.

“Melhor as máquinas com a sua hipersensibilidade… Sempre lhe fazem alguma companhia…” – pensou ele – e deixou de incomodar as enfermeiras. Passou até a gostar que as máquinas apitassem, mas condoía-o o facto de se ir embora e então a esposa ficar completamente só, alheada até da sensibilidade das máquinas.

E essa solidão era-lhe extensível a ele.

Sentado no sofá da sala, era como se um buraco negro se abrisse no chão à sua frente:

        “- Que farei quando ela partir…?  E se calhar já partiu mesmo…”

Por vezes tentava recordar-se da face da sua amada e não conseguia e isso deixava-o ainda mais desesperado: “-Se ela se for eu nem me vou conseguir recordar da face dela!”

Estava confuso, baralhado, ele sabia que “todos teríamos que morrer um dia”, mas nunca sonhara que fosse tão difícil.

Olhava para a sua frente e não conseguia vislumbrar um futuro sem ela. Era como se verdadeiramente lhe amputassem a alma. Iria transformar-se numa alma errante e fugidia – um “dead man walking” – à espera da sua hora para se juntar a ela definitivamente.

Toda a esperança lhe escapava entre os dedos e o buraco negro aumentava e engolia-o numa angústia insuportável.

Não conseguia antever nada de bom senão o inferno na Terra.

Foi ao seu quarto e abriu a única gaveta do armário que estava sempre fechada.

Tirou a seu revólver 38 e foi direito ao hospital, repetindo para si mesmo:

“- Não vou deixar a minha mulher morrer sozinha…”

Casos como este são bem mais frequentes que o noticiado.

Decidi escrever acerca desta notícia sobretudo para exemplificar um fenómeno frequente na Depressão e que não acontece em nenhuma outra doença orgânica: A Depressão tem esta particularidade de “atacar” o ser humano na última coisa a morrer – A Esperança.

Como diz o meu colega António Sampaio, mais nenhuma doença faz isso, nem mesmo o cancro.

É como se um vírus infectasse a alma e lhe retirasse esta arma que nos dá resiliência e alguma imunidade contra as adversidades, porque sem esperança baixamos os braços e desistimos.

É preciso estarmos atentos porque muitas vezes as depressões são silenciosas e a desesperança e as ideias suicidas dos nossos mais queridos podem estar a desfilar à frente deles sem que tenhamos a mínima noção disso.

O que fazer?

Perguntar.

Perguntar sem medo, sem qualquer receio de ser mal interpretado.

“- O que se passa? Anda a pensar em quê?”

E explicitamente tentar saber: “Tem tido pensamentos de fazer mal a si próprio? Não tenha medo de me dizer. Eu preciso de saber porque me preocupo consigo.”

Temos que lidar com a Depressão com a mesma falta de piedade com que ela mata, mas com o dobro da dose em carinho para quem está a sofrer com ela.

 

João Parente – Médico Psiquiatra e Psicoterapeuta

Maria já não sabe o que fazer…

Maria já não sabe o que fazer. Tudo na sua vida parece cinzento.

Tem uma família perfeita, um marido que faz tudo por ela, dois filhos que adoram a mãe, uma vida abastada, como ela nunca imaginou ter. Uma casa a seu gosto, que teve sempre a liberdade e a possibilidade de a decorar como quis, dois carros, uma casa na praia, uma casa no campo, um trabalho que antes adorava. Tudo na sua vida não justificava o seu sentir.

O que se passava com ela?

Desde há algum tempo que tudo parecia insípido, insuficiente, que nada lhe dava prazer, e tudo era feito com esforço. Um peso nos seus ombros, um aperto no peito que nunca lhe dava descanso. O tempo não ajudava. Quanto mais o tempo passava, mais a vida lhe parecia difícil. E ainda por cima, para ela, nada disto fazia sentido.

Como tinha ela chegado a este ponto?

Deixara de ser esposa, não conseguia ser mãe, nem se sentia pessoa. Arrastava-se da cama para o sofá, e do sofá para a cama. Abria o frigorífico e parecia que nada lhe apetecia, e com isso já perdera peso, e quando se olhava ao espelho, um dos seus maiores inimigos, parecia uma amostra do já tinha sido. E pensava todos os dias na ingratidão que era o seu ser: não tinha razão para assim se sentir. E isso ainda a deitava mais abaixo.

Outrora já tinha sido feliz.

Lembra-se distantemente desses momentos, onde a vida lhe sorria, onde ela era capaz. Sentimento agora desaparecido, a capacidade. E olhava à sua volta e ainda mais triste se sentia. Ouvia tantos que lhe diziam que também estavam deprimidos e seguiam com a sua vida. Que trabalhavam, enquanto ela estava de baixa há tanto tempo, que já medo sentia de voltar aquele lugar, que eram pais e mães, que eram pessoas, enquanto ela se sentia uma manta de retalhos, e que nunca mais sairia deste fosso de lodo que a prendia, e quanto mais ela batalhara no passado, mais enterrada ficava.

Era tão difícil para ela admitir que precisava de ajuda. Isso seria a confirmação do fracasso que se sentia. O marido já insistira, mas ela sentia que sozinha não conseguiria voltar à sua vida. E mais uma ouvia: “Eu também estou deprimida, mas sabes não me posso dar ao luxo de ficar em casa”, como se fosse um luxo ao capricho o seu sofrimento. E mais uma vez lhe diziam, amigos e estranhos “tens de te erguer de novo, faz um esforço”, e mais uma vez ninguém percebia que ela tentava todos os dias, e que o que fazia era o que conseguia. E quanto mais ouvia estas coisas pior se sentia.

Olhava para os olhos tristes dos filhos, que sentiam que a mãe já quase não existia, e para ela era mais uma facada no peito que sentia. Seria então uma opção?

Considerando que existem sete mil milhões de pessoas no mundo, e que a Organização Mundial de Saúde refere que existe uma média de cento e vinte e um milhões de pessoas com um quadro que permite um diagnóstico de um quadro clínico de depressão, nas suas diversas manifestações, vemos então que existe uma prevalência de 1,7% da população que é portadora desta doença.

Então porque ouvimos tantas pessoas que se afirmam estar deprimidas?

Isto inicialmente deve-se ao desenvolvimento massivo a nível de países, e que é verificado que quanto mais o país é desenvolvido, com visões mais capitalistas, tem mais psiquiatras por metro quadrado, podemos então afirmar que existem fatores extra biológicos que justificam esse mesmo quadro clínico. Ou seja, quanto mais temos acesso a diferentes objetos de desejo, variedade de produtos, e afins, maior se torna a nossa lista de necessidades, e a não concretização das mesmas aumentam exponencialmente o sentimento de insuficiência na nossa vida.

Pegando no exemplo, inclusivamente nacional, e olhando para as pequenas comunidades do interior de Portugal, em que o acesso a recursos diversificados é limitado pelo isolamento dessas regiões, a lista de necessidade sendo ela mais reduzida, mais facilmente as pessoas sentem os seus desejos satisfeitos, e logo diminuem algumas variáveis que contribuem para quadros depressivos.

Por outro lado, existem vários tipos de depressão, em que alguns tipos se tornam essências à aceitação de perdas naturais da nossa vida, como por exemplo a morte de um pai ou mãe numa idade avançada, de forma a não se desenvolver um quadro de luto patológico, outras tem uma valência mais biológica, em que elas perduram mesmo mudando algumas condições externas à pessoa, tendo nestes casos que se recorrer à introdução de psicofármacos.

Em ambos os casos o acesso a psicoterapia é essencial no seu tratamento.

Então porque é que tanta gente se auto-rotula como depressivas, e além disso parecem que conseguem viver sem qualquer limitação evidente?

Isto deve-se ao facto da banalização da palavra depressão.

Os quadros clínicos de depressão, devem ser avaliados e diagnosticados por técnicos de saúde mental, pois muitas vezes se confundem sentimentos de tristeza que podem ser semelhantes aos verificados nos casos de depressão clínica, que contribuem para esta denominação incorreta e uso excessivo deste termo.

Estar triste pode ser um estado de ânimo adaptativo e normal e não deve ser confundido com tristeza.

Quando olhamos para os critérios necessários para este diagnóstico, o primeiro e primordial, é a interferência de forma evidente destes mesmos sintomas na vida quotidiana da vida do paciente. Outros são os critérios que vos convido a pesquisarem, em que podemos afirmar que os mais conhecidos são sentimentos de tristeza profunda e melancolia mantidos durante um período alargado de tempo, uma incapacidade de olhar para si e para o futuro de forma justa e realista, pois parece que este quadro nos coloca um filtro cinzento à frente dos nossos olhos, e que faz com que tenhamos uma visão em túnel e que impossibilite uma plasticidade de conseguirmos dar significado diferente às diferentes áreas da vida da pessoa.

A banalização desta palavra contribuiu para dificultar a perceção do que verdadeiramente se trata quando falamos de depressão.

Comentários como “eu também estou deprimida e sigo com a minha vida” ou “tens de fazer um esforço” ou “tu podes dar-te ao luxo de estares deprimida” vêm corroborar a ideia negativa que os doentes sofrem de depressão, podendo nem ser este caso.

Como antes foi referido esta doença é verificada em quase duas pessoas em cem e, pelo que sabemos, parece ser uma doença mais prevalente do que é na realidade.

Procure ajuda especializada se começar a ter os sintomas mais conhecidos da depressão, para corretamente ser avaliada e ser tratada atempadamente, pois quanto mais tempo se vive com a doença, mais difícil se torna sobreviver a ela!

 

Pedro Garrido – Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta

Curas distorcidas

                      Esta é uma reflexão acerca do que se faz para se evitar o inevitável.                               – O quê? Pergunta o leitor.

                      Fazer o que nos tempos actuais a sociedade ensina para evitar a dor.                  De entre as receitas que prometem curar e/ou controlar o que não se quer, tal              como, ficar deprimido, ter ansiedade, ficar “em baixo”, doente, ou ser infeliz; elegi:             Fazer meditação, ter pensamentos positivos, e ser uma boa pessoa.

Estas são receitas que algumas pessoas trazem para a terapia e que, paradoxalmente, estão associadas a confusão, frustração e ansiedade. Carlos Drummond de Andrade já nos tinha dito que “A dor é inevitável. O sofrimento é opcional.” E sabemos o quanto isto nos dá trabalho. O ponto de partida costuma ser “fazer por se evitar”, mas DEVERIA ser “fazer para se lidar”.

Fazer meditação é amplamente divulgado como ferramenta essencial de cura mas para ser eficaz requer uma relação entre corpo, coração e cabeça. A meditação funciona quando somos capazes de direccionar a atenção para uma parte dolorosa, abri-la e, posteriormente, criar uma nova consciência acerca de nós com esta experiência. Para isto é preciso estar totalmente (corpo+coração+cabeça) presente no momento e receber a auto-compaixão associada do momento de sofrimento recordado. Se não conseguir usar a informação do corpo para a traduzir e enquadrar com a cabeça será uma experiência incompleta de cura. Também pode acontecer que não saiba distinguir o que são as suas emoções e o que é a sua pessoa. Por exemplo, escutar partes internas críticas e de julgamento é, com frequência, a primeira adversidade que se encontra quando se começa a meditar. Às vezes, a primeira e última, porque o resultado de encontrar-se com um lado julgador sem ter o seu lado autêntico presente será mais ou menos como ser atirado aos lobos sem protecção. Provavelmente não vai querer repetir a experiência e talvez até queira mesmo passar a evitá-la porque tornou em medo, confusão e divisão uma experiência que se pretendia ser de alívio, clareza e de reunificação.

Os pensamentos positivos têm a capacidade de nos dinamizar, aumentar a nossa confiança e prontificar para a acção. Podem ser poções mágicas de realização porque tocam no acreditar que é possível. Relembrando Osho, os pensamentos positivos ganham poder quando se colocam no mesmo patamar que os negativos e não quando os renegam e se faz de conta que não existem. Não podem ser usados para ler estados emocionais desagradáveis; por exemplo, se acorda de manhã e não se sente animado não poderá pensar que se sente animado. Conseguir aceitar a forma como se sente e deixar correr o dia pode ser uma boa opção. Ou seja, tolerar a incerteza de como será o passar do dia quando não acorda animado pode ser surpreendentemente positivo. Se distorcer e negar a sua verdadeira realidade (do momento) estará a ser desonesto consigo e, se o fizer por sistema, poderá perder a  oportunidade de ficar disponível para encontrar o que o torna verdadeiramente animado. Contar mentiras a si próprio, acerca de si próprio, contribuirá apenas para se desligar do sentimento de si e desviar-se do seu projecto de cura.

Diria que ser uma “boa pessoa” é um princípio orientador de conduta associado ao que está certo e é bom nas pessoas. A desorientação surge quando as pessoas não sabem o quanto boa tem que ser para ser considerada uma boa pessoa e perdem-se, por exemplo, a fazer coisas pelos outros ou a evitar dores inevitáveis. Colocam sistematicamente os outros à sua frente porque ganham a aceitação (intermitente) que não têm em relação a si mesmas e, com isto, não sabem separar-se do que é informar os outros daquilo que lhes causa dor, do que é a satisfação associada à afirmação da sua defesa, do que é ter prazer em infligir dor ao outro. Uma boa pessoa tem a clareza da posição que ocupa em relação aos outros e ao mundo. Pode sentir, pensar e agir contra a vontade dos outros e continua a ser boa pessoa porque isto só significa que é diferente do outro e que está a defender valores como respeito, confiança, amizade, compaixão, gratidão, etc. Uma boa pessoa por instrução racional e sem consciência dos seus próprios valores estará muito desviada do seu auto-conhecimento e do que nos torna realmente bons. Deixar de ser boa pessoa porque já não serve as necessidades do outro é, no mínimo, perverso e não representa nenhum tipo de cura, nem pessoal, nem, e muito menos, para a humanidade.

Sabemos que é importante criar a oportunidade de nos separarmos de partes dolorosas para funcionarmos no dia-a-dia mas também que a verdadeira libertação acontece quando as curamos. Curar não é esquecer a dor, é integrar em nós de forma mais harmoniosa aquilo que nos dói. A melhor terapia usa a consciência para curar o coração (Kornfield, 2012) e isto implica alívio do medo de se ligar a si e aos outros com a benesse de conseguir transformar experiências dolorosas. A conexão estabelecida numa relação terapêutica ensina-lhe como a dor contém verdades que abrem o seu coração à alegria e à vida. É que do outro lado da dor está a força e a confiança, e, acredite, não vai querer perder esta parte. Porque depois de dizermos adeus aos demónios, precisamos aprender a viver com os nossos anjos, chama-se a isto capacidade para uma vida plena (Russel, 2015).

Rita dos Santos Duarte – Psicoterapeuta

Estar deprimido….. como lidar com a depressão?

depressao

Hoje em dia, são cada vez mais os relatos de casos de depressão ou de um humor grandemente depressivo.  Contudo, é importante ter em consideração que existem diferenças entre um quadro de “Depressão” e oscilações normais de humor.

Todos nós temos dias em que nos sentimos mais animados e positivos e dias em que nos sentimos com menos energia e motivação. Estas oscilações emocionais fazem parte do próprio sistema de homeostasia emocional do nosso corpo e são perfeitamente normais. O ideal será respeitar ao máximo estas emoções, observá-las, aceitá-las e descobrir a melhor forma de lidar com estas variações de humor.

De notar que aceitar e respeitar uma emoção não significa inércia ou que nada façamos para encontrar uma forma de lidar eficazmente com esta. Por exemplo, se nos estivermos a sentir particularmente tristes ou com falta de energia podemos ser ativos na procura de uma estratégia positiva que nos permita subir um pouco a nossa energia e nos proporcione prazer. Estas alternativas dependerão de cada individuo, dos seus gostos e preferências e do seu próprio mecanismo de funcionamento individual. Para algumas pessoas, um passeio junto ao mar opera milagres, para outras poderá ser a companhia dos que lhe são queridos, uma sessão de exercício físico, ou mesmo, a combinação de várias atividades.

Quando os sintomas “depressivos” persistem durante um período de tempo contínuo e prolongado podemos então falar de um quadro depressivo, com diferentes níveis de intensidade.

A depressão diferencia-se então das normais mudanças de humor pela gravidade e permanência dos sintomas. Está associada, muitas vezes, a ansiedade e/ou pânico.

Os sintomas mais comuns são:

  • Desinteresse, apatia e tristeza;
  • Modificação do apetite (falta ou excesso de apetite);
  • Perturbações do sono (sonolência ou insónia);
  • Fadiga, cansaço e perda de energia;
  • Sentimentos de inutilidade, de falta de confiança e de autoestima, sentimentos de culpa e sentimento de incapacidade;
  • Falta ou alterações da concentração;
  • Preocupação com o sentido da vida e com a morte;
  • Alterações do desejo sexual;
  • Irritabilidade;
  • Manifestação de sintomas físicos, como dor muscular, dor abdominal, enjoo.

 

Muitas vezes o indivíduo pode evitar procurar ajuda especializada, ao sentir-se embaraçado e humilhado por não ser capaz de executar uma determinada tarefa ou atividade ou por “não ter razões para estar deprimido”.

No entanto, existem ainda casos em que a depressão é considerada como uma parte inevitável e normal da vida, sendo por isso, negligenciada.

A depressão clínica é uma condição séria e ameaçadora da vida. Quando o nosso funcionamento se deteriora e os pensamentos são cada vez mais sombrios e sobrecarregados devemos procurar ajuda adequada e iniciar o mais rapidamente possível uma abordagem psicológica/psicoterapêutica.

Durante este processo, é muito importante ter em consideração uma série de aspetos, sendo que o primeiro passo passará sempre, inevitavelmente, pela consciência e aceitação da sua situação e pelo desejo de mudança:

  • Procurar adotar uma alimentação saudável e ter um sono regular (6 a 8 horas, consoante as necessidades individuais). Se existirem insónias, ler ou dedicar-se a alguma atividade e no dia seguinte tentar acordar à hora planeada ou não muito mais tarde. Tentar não dormir durante o dia, para que o corpo sinta sono no período normal da noite.
  •  A prática regular de técnicas de respiração e meditação constitui um valioso contributo na recuperação e prevenção futura.
  • Praticar exercício físico que produz a estimulação de adrenalina (durante) e endorfinas (após), proporcionando energia e uma sensação de bem-estar.
  • Praticar atividades prazerosas e contrariar a inércia que aumenta a sensação de inutilidade e derrota. Elaborar uma pequena lista com algumas tarefas que sejam realistas e concretizáveis (ir adaptando consoante a evolução), tentar que sejam agradáveis mas se não o forem não se culpabilizar ou martirizar. Insistir e pensar em novas alternativas.
  • Procurar a companhia de amigos, sair, conversar, partilhar.
  • Identificação de pensamentos negativos e destrutivos e substituí-los por pensamentos positivos e mais adaptados.

A ajuda psicológica/psicoterapêutica poderá constituir-se como um auxiliar muito positivo de identificação de fatores disfuncionais, de criação de alternativas e estratégias adequadas para lidar e ultrapassar o quadro depressivo, e na planificação e gestão de novas rotinas e hábitos de vida.

Sofia Rodrigues – Psicóloga clínica e Psicoterapeuta

“Christmas Blues” A tristeza que vem com o frio

Christmas blues

Alguns estudos referem que cerca de 20 a 30 % da população ocidental sofre de depressão de natal ou “Christmas Blues”, sentindo nesta altura de festas alguma angústia, desamparo e ansiedade que se assemelham a um quadro depressivo. 

As razões podem ser várias e diversas, desde uma maior pressão para o consumo, ao reavivar de saudades de entes queridos já falecidos, ou mesmo solidão.

De facto, nesta época, as famílias são tremendamente pressionadas para maiores gastos financeiros em prendas e na preparação de festas que em qualquer outra época do ano.

As “exigências” interiorizadas pelas pessoas e que advêm da pressão do marketing mediático obrigam-nas a um périplo por várias e diferentes lojas na busca da prenda ideal para cada familiar ou amigo, para o filho deste e para a sobrinha daquele. Fazem-se listas compras e calculam-se orçamentos, planeiam-se dias com roteiros para determinadas compras e reservam-se outros para tantas outras. O suposto espírito altruísta do Natal transforma-se numa azáfama stressante e cansativa para cumprir um determinado roteiro de compras intermináveis em lojas apinhadas de gente igualmente impaciente que a noite de Natal chegue, as lojas fechem e as compras acabem.

Em momentos de lucidez acabamos por parar e perceber que o espirito do Natal foi subvertido, que o propósito do Natal não é esta vertigem consumista, e a consciência disto pode trazer-nos sentimentos de tristeza e culpa imediatamente após uma corrida desenfreada, esgotante e cheia de boas intenções às últimas compras.

Por outro lado, a época de Natal é tipificada como a festa em que a família se reúne, se revê e confraterniza, mas se você tiver perdido um ente querido há pouco tempo, é natural que esta época reavive os seus sentimentos de luto e de saudade e que, dependendo do caso, podem ser avassaladores.

Devemos ainda recordar-nos que, num mundo que se “globalizou”, não é raro que hajam familiares emigrados em países longínquos e que não podem estar presentes, e essa ausência pode ser antecipada e sentida com tristeza e saudade.

Sabemos também que uma parte significativa da população idosa vive sozinha, muitas vezes sem grande apoio familiar e em situações de desamparo em que os sentimentos de solidão física e afectiva que se tornam mais evidentes nesta época festiva em que seria suposto sentirem-se mais amados e apoiados.

Frequentemente, os sentimentos de tristeza, culpa e ansiedade que são sentidos nesta época têm a ver com um desfasamento entre as expectativas que interiorizámos do que deveria ser o Natal – enquanto festa religiosa e de comunhão de afectos – e aquilo que muitas vezes acabamos por vivenciar.

De facto, ninguém deseja que o Natal se transforme em dias de stress financeiro e fúria consumista, ninguém espera que uma época universalmente festiva traga um reviver da mágoa dos lutos mais difíceis ou uma consciência ainda mais aguda duma situação de solidão e de desamparo.

As expectativas depositadas são frequentemente melhores do que muitas vezes a vida nos traz e este desfasamento pode trazer sentimentos legítimos de dor e frustração.

 

Os dados do National Institute of Health, nos Estados Unidos da América, apontam o Natal como o período do ano no qual há uma incidência maior de depressão.

Mas, de facto, não é claro para todos os investigadores que exista um aumento da incidência de Depressão no Natal ou se este aumento da incidência resulta de um certo número de factores que nem sempre são levados em conta.

Além da maior frequência de episódios depressivos no contexto da Doença Afectiva Sazonal (*), é nos meses de inverno que ocorrem mais intercorrências infecciosas, o que condiciona com uma maior morbilidade e mortalidade em pessoas idosas com outras patologias orgânicas associadas, nomeadamente diabetes e/ou doenças cardiovasculares.

Estes episódios de agravamento clínico podem despoletar quadros depressivos ou agravar depressões pré-existentes.

Por outro lado, sabe-se que a incidência de suicídio diminui nos meses de inverno e aumenta com a chegada da primavera.

Os dados que existem sobre o “Christmas blues”, essa tristeza sazonal por altura do Natal, são vagos e pouco precisos, sobretudo porque não está propriamente catalogado como uma patologia mental.

Mas esta tristeza de Natal, apesar de ter sintomas sobreponíveis aos de uma depressão, não significa necessariamente que se trate de um quadro depressivo.

O “Christmas blues” é habitualmente passageiro e não tende a evoluir para um quadro clínico de depressão.

         Passada a época festiva e com o retomar das rotinas habituais do dia-a-dia, estes sentimentos de tristeza tendem a desvanecer-se e a remitir naturalmente.

No entanto, o “Christmas Blues” pode mimetizar uma depressão suave, além de que ocorre na mesma época da Doença Afectiva Sazonal. (*)

No “Christmas Blues”, tipicamente, os sintomas de tristeza e ansiedade não se intensificam ou agravam, e não se prolongam no tempo.

Assim, se a tristeza e a ansiedade se intensificarem ou se prolongarem no tempo deverá consultar o seu médico de família e expor a situação. De facto, pode então tratar-se dum episódio de Doença Afectiva Sazonal ou pode a época natalícia ter contribuído como factor desencadeante, entre outros acontecimentos de vida, para o despoletar de um quadro depressivo que pode merecer cuidados médicos e/ou um acompanhamento psicoterapêutico adequado.

 

(*) Doença Afectiva Sazonal – Tipo de Depressão na qual os episódios depressivos recorrem anualmente, geralmente durante os meses de inverno, e em cujo tratamento está a indicada a Fototerapia.

 

João Parente – Médico Psiquiatra e Psicoterapeuta

Setembro e a Primavera

Setembro e a primavera

«Outono é outra primavera, cada folha uma flor.»
Albert Camus.

Chega Setembro e, muitas vezes com ele, surge uma sombra, um negrume…
Esta sensação, na maioria dos casos, felizmente, corresponde apenas à elipse aparente do sol, responsável pelas estações do ano, ou seja, neste caso, setembro trás consigo o equinócio que anuncia o final do verão e o início do outono, e trás também outras vibrações e humores.

Se na primavera tudo renasce, a alegria parece despontar juntamente com as folhas, e, até um sorriso de esperança pode surgir quando tudo anteriormente parecia estar mal; no outono, a queda da folha vem acompanhada duma sensação de recolhimento, de despedida dum verão que já lá vai, e, quantas vezes, duma sensação de perda ou de aprisionamento no dia-a-dia.

Se, para algumas pessoas, ou nalgumas fases da vida, regressar à rotina significa “descansar das férias”, pôr em prática ideias que foram germinando e crescendo ao longo da primavera e verão, um período de baterias carregadas que espalharão a sua energia pelos próximos meses; para outras pessoas, ou, noutras alturas, o regresso não entusiasma. E não é apenas pela saudade das férias, ou dos dias grandes, ou pelo retomar dos horários e responsabilidades que acompanham Setembro, mas sim, por uma quase certeza de que, afinal, nunca nos chegámos a libertar dum peso que nos encurva a alma e vive connosco.

Receio que, quando estamos perante este último quadro, seja sinal de que não fizemos as “limpezas de primavera”, ou seja, reencontrámos uma sensação que há muito nos acompanha, mas da qual nos tínhamos conseguido afastar durante a primavera e verão. Como se a primavera tivesse de facto trazido esperança, e que, mais uma vez, tivéssemos acreditado que tudo iria mudar sem necessitarmos de arrumar, limpar, fazer mudanças… É que a esperança pode ser tão amiga quanto adversária: amiga quando já nada podemos fazer, quando tudo saiu do nosso controlo e só ela nos resta; mas adversária, quando nos trava e impede de agir porque nos agarramos a ela, não conseguindo ver que ela está em nós, no que fizermos de, e por nós.

Agora, ao olharmos os dias mais curtos e a chuva a não conseguir soltar o cheiro a terra e relva cortada, mas apenas mostrar o sujo acumulado, apercebemo-nos de que nada mudou, estamos no mesmo sítio outra vez, sem sol, sem verde, sem azul, e, quantas vezes, também sem esperança. Apenas “nós e a nossa condição”.

Se Setembro se apoderou de si, não apenas com o seu vento fresco, cores de mel, uvas e vinho, sabores caseiros e reconfortantes, nem tão-somente com alguma nostalgia ou negrume, mas sim com uma densidade espessa e pegajosa que lhe tira o ar, não espere pela próxima “limpeza de primavera” para fazer arrumações e alterações.

Aproveite esta época de regresso para se revisitar a si própria/o, desarrumar o que parecia arrumado e não está, reciclar o que parecia perdido, deitar fora o que já não interessa, e habitar o vazio que encontrar. Assim, quando chegar a próxima primavera, poderá começar a redecorar o seu interior e renascer de facto. É necessário limpar o terreno e tratar da terra para que algo possa florir. Este trabalho requer ajuda profissional.

Não se convença de que “é sempre assim”, ou “não há nada a fazer”, de que “só os fracos procuram ajuda” ou de que “o tempo tudo cura”. Falar com um psicoterapeuta pode fazer toda a diferença; haverá situações em que poderá necessitar de medicação, haverá outras em que tal não será necessário, mas essa não deverá ser uma decisão sua, ou, apenas sua. E como é bom poder e conseguir partilhar fardos…

Afinal, Setembro é um mês de recomeços, em que também algo poderá nascer…

Iniciei este texto com uma frase de Albert Camus, deixo-vos com alguns versos do poema “A mão no arado” em “O problema da habitação” de Ruy Belo

«Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
(…)
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs do verão …»

Cristina Marreiros da Cunha – Psicóloga e Psicoterapeuta

Dificuldades na intervenção na Depressão

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Portugal é o país europeu e o segundo do mundo com maior taxa de depressão na ordem dos 25%, pelo que, apesar das variáveis com melhor predição no sucesso terapêutico serem as carcterísticas do próprio paciente e a relação terapêutica em vez do correcto dignóstico de Eixo I, é urgente compreendê-la e antecipar dificuldades específicas.

Na maior parte das vezes, a depressão tem na sua base uma vivência de abandono ou perda, que face a um deteminado acontecimento de vida, activa crenças de incapacidade, falha, culpabilidade invadindo o funcionamento relacional, profississional e social de quem a sofre e aniquilando uma vivência tranquila do aqui e agora. Parafraseando o Professor Coimbra de Matos “nada ou pouco interessa no presente real e pouco ou nada é imaginado como bom ou apetecível no amanhã”.

A lentificação e a falta de prazer poderão constituir dificuldades ao terapeuta, nomeadamente, impaciência face à sua genuína vontade de ajudar o paciente. É também necessário que o clínico se sinta confortável para lidar com a temática da morte, tantas vezes presente, quer em pensamentos quer em acção, na depressão. Face à tristeza, é natural sentir compaixão, e por vezes,  um impulso de tirar a pessoa do seu “buraco negro”, que deveremos refrear. A validação e a empatia assumem aqui um papel fundamental. Deveremos “ver” a sua história na sua prespectiva, sem julgamento, reconhecendo o seu sofrimento, e mostrando que estaremos ao lado dele, sem pressa. Só assim, este poderá reescrevê-la, aceitá-la e, mais tarde, implementar as mudanças necessárias para recuperar o contacto consigo e com o mundo. Qualquer ganho, por mais pequeno que seja, como por exemplo, ficar na cama 14 horas e 45 minutos por dia em vez das15 horas habituaus deverá ser reforçado.

Assim, deveremos ser responsivos na nossa intervenção, ou seja, o processo terapêutico deverá ser como uma dança, cujo ritmo é dado pelo paciente, com o objectivo comum de melhoria do seu bem-estar.

Catarina Barra Vaz – Psicoterapeuta e Neuropsicóloga