Estão três pessoas a pôr tijolos e passa um homem que pergunta a cada uma:
“O que é que está a fazer?”. A primeira responde:
“Estou a assentar tijolo”.
A segunda responde:
“Estou a montar uma parede”.
A terceira responde:
“Estou a construir uma catedral”.
Quando olha para a sua vida o que é que vê? No que é que está a investir?
Facilmente caímos no erro de achar que a vida é o que é e que não temos qualquer poder sobre ela, mas será de facto assim?
Na história inicial, três pessoas, de um ponto de vista externo, partilham a mesma realidade, estão a pôr tijolos, mas de um ponto de vista interno, cada uma tem diferentes perspectivas do que está a fazer, dá um significado diferente ao seu trabalho, o que sugere uma postura diferente perante a vida.
A primeira parece olhar o mundo de um ângulo muito estreito, focada na tarefa mas com pouca visão da imagem maior, do objectivo, do propósito. Há momentos em que este modo é importante, focarmo-nos no aqui e agora, sem passado nem futuro, a estar simplesmente; mas é arriscado estarmos sempre aqui; perdendo o objectivo maior, a visão macro, corremos o risco de desmotivar, perder o rumo, perder o sentido da vida.
A segunda já parece ter aumentado um bocadinho o ângulo, já tem esta perspectiva maior, já há um propósito, um objectivo; a esta o que parece faltar é a visão mais sonhadora, mais idealista; há uma ideia dos objectivos intermédios mas faltam os objectivos maiores, os projectos de vida.
A terceira parece ter o ângulo mais abrangente; há um projecto de vida no qual está a investir, para o qual está a trabalhar. Há também um potencial risco nesta postura; se ficarmos só pelo objectivo último, sem investir nas capacidades e ferramentas que precisamos para o alcançar, corremos o risco de nunca o realizar. Não parece contudo ser o caso aqui, há um sonho mas há também o pô-lo em prática e começar a construí-lo do princípio.
Clarificadas estas três formas de estar e olhar para a vida, urge questionar:
Primeiro, onde é que eu me coloco? E segundo, o que é que eu quero fazer da minha vida? Quero assentar tijolo, montar uma parede ou construir uma catedral?
Sabemos que a fome mata nalgumas partes do mundo, duma forma que nada tem a ver com o que acontece nos chamados países desenvolvidos. As condições de saúde são outro dos grandes diferenciadores entre os países do chamado primeiro mundo e os países subdesenvolvidos. As grandes epidemias que dizimam milhares de vidas e os escassos recursos duma parte do planeta, não se comparam ao tipo de doenças e às condições sanitárias a que nós temos acesso. Nesta parte privilegiada do globo os problemas de saúde com que nos vemos confrontados estão, cada vez mais, associados a doenças que de alguma forma se podem prevenir introduzindo mudanças em hábitos comportamentais. Ou seja, vivemos num lugar e num tempo em que os nossos comportamentos assumem um papel preponderante na saúde que vamos tendo.
Não constitui hoje novidade que a actividade física regular e cuidados com a alimentação, assim como um estilo de vida saudável em ambientes pouco poluídos, constituem uma mais-valia para um percurso com saúde. A esperança de vida continua a aumentar, mas a consciência de que esse aumento de longevidade pode ser feito com tanto mais saúde, quanto nós enveredarmos por escolhas saudáveis, felizmente também.
Há contudo alguns aspectos que convém lembrar. Por um lado a hereditariedade e a genética têm uma palavra a dizer na longevidade e na forma como se desenvolvem algumas doenças. Por outro, a forma como vivemos é importante, não só para evitarmos algumas dessas doenças, como também porque podemos influenciar a altura ou a forma como elas se manifestam e a que velocidade e intensidade vão ou não infligir os seus danos.
Todos sabemos que “os acidentes acontecem”. Mas nunca antes tivemos tantas condições para prevenir alguns desses acidentes como actualmente. Não é seguramente saudável viver angustiado ou obcecado com a prevenção de acidentes, ou com o nosso estado de saúde, mas adquirir hábitos saudáveis, como uma nova rotina, e visitas regulares ao médico está ao nosso alcance.
Enquanto psicóloga clínica e psicoterapeuta, preocupo-me especialmente com a saúde mental. É curioso, pensarmos e darmos como certo que conseguimos treinar o corpo para fazer esta ou aquela habilidade (atletismo, ginástica, dança, malabarismo, tocar um instrumento musical, etc, etc) e termos dúvidas sobre como podemos treinar a nossa mente ou mudar alguns dos nossos comportamentos. Certo é que a plasticidade neuronal faz com que tal seja possível.
Em saúde mental também surgem problemas de doença que ocorrem por acidente, hereditariedade ou problemas genéticos, mas a grande parte dos problemas de saúde mental que nos afectam ao longo da vida surgem de questões ambientais/educacionais/comportamentais e, na grande maioria dos casos, da combinação de factores de vária ordem que influenciam a forma como nos sentimos e como percepcionamos e pensamos o que nos rodeia, isto é afectam as nossa crenças sobre nós e os outros, as nossa vivências e o modo como gerimos as nossas emoções.
Quer na doença mental, quer na recuperação e manutenção da saúde psicológica, é possível melhorar através de novas formas de olhar a doença, a saúde, de nos olharmos a nós próprios, os outros, a existência, a vida, ou seja, através de mudanças com as quais nos podemos comprometer.
Todos nós necessitamos de sermos únicos e ao mesmo tempo de nos sentirmos próximos, ou seja, a nossa necessidade de diferenciação é tão importante como a nossa necessidade de intimidade. A nossa necessidade de paz e sossego é tão importante quanto a nossa necessidade de actividade e procura. A nossa necessidade de estabilidade e rotina é tão necessária quanto a nossa necessidade de inovação e aventura. Se estas e várias outras necessidades são, de alguma forma comuns a toda a gente, o seu grau de intensidade, ou a altura em que preferimos habitar mais um lado ou outro deste contínuo, varia de pessoa para pessoa e na mesma pessoa, varia ao longo do tempo e em diferentes fases da vida.
Evoluir em saúde mental é saber estar atento a essas necessidades, saber escutar as nossas emoções, ouvir as diferentes partes de nós que muitas vezes nos pedem coisas opostas, viver as contradições, compreender porque existem e aprender a dialogar e regular esse mundo interior que habitamos ao mesmo tempo que regulamos diferenciadamente as nossas interacções com o nosso mundo exterior.
Melhorar a nossa saúde mental é aumentar o grau de conhecimento sobre nós e o grau de liberdade e responsabilidade pelas escolhas que fazemos, tornando-as verdadeiramente nossas.
Viver com saúde mental, é conseguirmos conviver com um mundo infinitamente grande e muito maior do que nós (macroscópico), sem, por isso, nos sentirmos insignificantes e, simultaneamente conseguirmos conviver com um mundo infinitamente mais pequeno que nós (microscópico), sem que isso nos faça sentir Reis ou donos do Mundo.
Abraçar a nossa saúde mental é conseguirmos interagir com o que nos rodeia e olhar para nós simultaneamente, como uma simples nota musical, de timbre, altura e intensidade única ou como uma gota de tinta, de brilho, cor e tonalidade específica, mas também como uma linha melódica ou um movimento de pincel, e ainda, e também, como um todo composto por partes; uma sinfonia em curso, ou um quadro que se vai transformando, como um bailado de nós connosco e de nós com os outros.