Perda ou Transformação?

Na minha prática clínica tenho-me deparado com uma grande dificuldade dos meus pacientes em expressarem desacordo, mágoa, ressentimento, ou agirem de formas contrárias àquilo que sentem que são as expectativas ou desejos de outros significativos.
Ao explorar o que é que receiam que aconteça se se expressarem de forma congruente com o que estão a sentir, surge frequentemente o medo de perder o outro, que o outro não suporte a crítica ou o desacordo e que haja uma ruptura na relação.
Um trabalho útil com estes pacientes é treinar a assertividade, explorando formas de nos afirmarmos perante estes outros significativos de uma forma cuidadosa que melindre o outro o menos possível; mas a realidade é que estes pacientes não deixam de ter algum fundamento no seu receio, frequentemente os primeiros movimentos de auto-afirmação são de facto mal recebidos do outro lado.

A reflexão que vos venho propor é até que ponto é que esta reacção menos positiva do outro implica necessariamente perda ou, pelo contrário, potencia transformação da relação.
Não sejamos utópicos, se introduzo uma dinâmica nova na relação (por exemplo expressar mágoa por a minha opinião não ter sido levada em conta numa decisão com implicações para os dois), não posso esperar que o outro mantenha a mesma postura, ele terá que digerir a novidade e precisaremos os dois de um período de ajustamento à nova dinâmica, ou de um período de negociação de uma terceira dinâmica, construída em conjunto, que responda de forma mais equilibrada às necessidades de ambos. Ou seja, preciso dar espaço ao outro para que ele me devolva o ponto de vista dele sobre a situação que desencadeou o problema, como é que ele lida com esta mudança no sistema que eu estou a propor, e que condições é que ele precisaria ter satisfeitas para conseguir de forma mais tranquila responder à minha necessidade (por exemplo, o outro poderia devolver que não se tinha apercebido que eu tinha uma opinião diferente, mas que de facto era importante para ele que eu estivesse confortável com a decisão e precisaria por isso que eu passasse a expressar as minhas opiniões com mais clareza para ele perceber que há ali uma opinião contrária que precisa ser levada em conta).

E pensarão: “mas comigo isto não funciona assim, o outro não vai reagir tão bem”. Talvez tenham razão, é provável que a primeira reacção seja de defesa e de desagrado pelo comentário, mas lá está o tal período de ajustamento e de negociação, em que o treino de assertividade referido inicialmente tem um papel importante no mantermo-nos afirmativos das nossas necessidades e direitos por um lado, e ao mesmo tempo abertos a perceber o ponto de vista do outro, que elementos é que estão a dificultar a compreensão da mensagem de ambos os lados, e como é que podemos atingir um equilíbrio entre aquilo de que cada um não abre mão e no que estamos disponíveis para ceder.

Joana Fojo Ferreira – Psicóloga e Psicoterapeuta

Assertividade – Como se afirmar sem gritar.

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Diz-se que a sociedade de hoje está muito egoísta mas, na verdade, em muitos momentos sentimos dificuldade em afirmar o que somos, pensamos e sentimos em diversos contextos (profissional, social, familiar, conjugal, etc).

De facto, muitas vezes se confunde agressividade com assertividade. A grande diferença entre ambas é que na primeira afirmamos-nos atacando, não dando espaço ao/s outro/s enquanto que na segunda somos capazes de reconhecer o outro que é necessariamente diferente de nós, com as suas expectativas, crenças e sentimentos, dando-lhe espaço para manifestar-se. No fundo, para sermos assertivos temos de aceitar que eu não sou o outro nem o que o outro espera de mim, mas também o inverso, e que os conflitos, sejam internos (connosco próprios) ou externos (com outro/s) fazem parte da existência humana.

Além da aceitação da diferença e do conflito, a assertividade pressupõe auto-estima, ou seja, gostarmos de nós próprios, para termos capacidade e nos julgarmos merecedores de satisfazer as nossas necessidades. Quando a auto-estima é deficitária, por norma, temos uma atitude passiva, pondo o controlo no outro. Não reconhecemos os nossos direitos e não os reivindicamos o que pode gerar um ciclo vicioso pernicioso: “ninguém me respeita”, “abusam sempre de mim”, etc., quando somos nós próprios que o permitimos.

Existe também o comportamento manipulativo no qual, de forma discreta, damos a entender que atendemos às necessidades dos outros, mas só o fazemos para ter ganhos próprios. Primeiramente poderá ser confundido com assertividade, mas quando descoberto, minará as relações interpessoais.

É salutar que em situações em que nos sintamos mais vulneráveis adoptemos uma assertividade mais defensiva e agressiva enquanto que quando nos sentimos protegidos e aceites a tendência é uma assertividade mais passiva, pois não temos necessidade de nos afirmar.

A assertividade pode ser aprendida e desenvolvida. Habitualmente, temos mais dificuldade em determinados settings (por exemplo, não temos qualquer questão com os nossos familiares, mas não conseguirmos ser assertivos com o nosso chefe), ou seja a pessoa não se categoriza assertiva em termos absolutos mas sim contextualmente.

Ao sermos mais assertivos aumentamos o respeito por nós próprios e autoconfiança no relacionamento com os outros, não tendo uma necessidade constante de aprovação. Consequentemente, os outros respeitar-nos-ão mais e teremos relações interpessoais mais satisfatórias.

Catarina Barra Vaz