O colo de Deus…

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L., 62 anos, administrador executivo numa empresa de equipamentos electrónicos, cresceu numa família onde foi iniciado na magia dos gestos de amor.

“Sabe?

Ontem, uma vez mais, adormeci a pensar na minha mãe que Deus tem.

Depois dela conheci muitas mulheres, mas nenhuma como ela.

Ela acordava-me de manhã como um sopro muito suave na testa ou a acarinhar o meu cabelo muito ao de leve com um dedo apenas…

Eu nunca acordava em sobressalto. Ela tinha este talento de me fazer acordar tão devagarinho que eu nem sentia a diferença entre estar a dormir e acordar.

Só ela, até hoje, conseguia acordar-me assim…

Quando hoje o dia me corre mal, quando eu vou angustiado com alguma coisa para a cama eu peço a Deus que me acolha no seu regaço. Ou ao pólo feminino de Deus. Ou a Nossa Senhora. Eu peço aquele colo que a minha mãe me dava e mais ninguém sabia ou soube como me dar.

É um colo protector, é um colo onde nada me pode acontecer e, mais que uma sensação de segurança, o que é mais vibrante e intenso é a sensação de estar envolto neste estranho Amor de mãe.

Muito raramente lá acontece eu adormecer e cair no colo de Deus…

E eu acho que aprendi com a minha mãe.

Quando a minha filha tinha 2 anos ela começou a acordar muitas vezes de noite e ficava em pânico por não nos ver ao pé dela.

Acredita que por vezes eu era tão rápido que ela nem tinha tempo de começar a chorar?

E não é preciso dizer nada realmente… Eu passava-lhe a mão pelo cabelo e sussurrava um “Shhhhh” em suspiro e dizia-lhe: “Está tudo bem, querida. Não se passa nada.” e ela caía com a cara na almofada e adormecia ainda antes de se conseguir aninhar-se na cama dela…”

Fiquei a pensar como é que uma memória tão antiga perdura tão tarde na vida de alguém, como é que reaviva os olhos deste homem uma luz tão intensa de conforto e calor, e a resposta que se me oferece é que a responsabilidade é do Amor.

Um Amor maternal.

Quem sabe um Amor feminino, que se prolongou na Alma deste homem.

Um dia será a sua filha a lembrar a alguém a Magia do seu pai.

E a uma grande parte (para não dizer a maior parte) das coisas inexplicáveis da Experiência Humana têm a ver com o Amor, enquanto experiência vivencial que encerra em Si todas as línguas mudas e faladas e atinge as Almas das pessoas nos seus recônditos mais silenciosos deixando lá uma marca eterna e indelével.

 

João Parente – Médico Psiquiatra e Psicoterapeuta